Entenda mais sobre o Challenge Test, um teste muito utilizado para avaliar a eficácia e estabilidade do sistema conservante em produtos cosméticos
Introdução
Sistemas cosméticos são sistemas susceptíveis à contaminação e desenvolvimento de microorganismos. O uso de conservantes é necessário para proteger o produto cosmético contra a atividade de microrganismos (sobretudo patológicos) desde sua fabricação até o prazo de validade final. O Challenge Test é necessário para avaliar a eficácia do sistema conservante. Nesse artigo irei falar sobre o Challenge Test, assim como sugestões de conservação e laboratórios que realizam o teste.
Cosméticos e conservação
Os sistemas cosméticos são ambientes ricos em nutrientes que favorecem o desenvolvimento de microorganismos.
Logo, cosméticos, assim como qualquer sistema que contenha água e compostos orgânicos/inorgânicos, necessitam de proteção contra contaminação microbiológica para garantir a segurança do consumidor e aumentar o tempo de validade. A estratégia mais comum para alcançar isso é a aplicação de agentes antimicrobianos, que podem ser compostos naturais/sintéticos, ou ingredientes multifuncionais.
Existem diferentes tipos de componentes conservantes disponíveis no mercado. Esses ingredientes nem sempre são iguais quanto à atividade antimicrobiana que possuem, estando essa característica muitas vezes relacionada com a estrutura química e reatividade de grupos funcionais presentes em cada tipo.
Um conservante é uma substância de origem natural ou sintética que inibe o desenvolvimento de microorganismos. A inibição precisa ser efetiva em amplo espectro (atuar contra vários tipos de microorganismos, como bactérias e fungos), com duração que englobe a validade determinada para o produto.
A contaminação microbiológica pode acontecer durante a fabricação do produto (contaminação primária) e/ou durante o uso do produto pelo consumidor (contaminação secundária).
Para minimizar as chances de problemas, é importante que todas as possíveis fontes de contaminação sejam identificadas e monitoradas.
Quatro etapas principais devem ser consideradas: (1) inspeção e controle de matérias primas; (2) processo de fabricação/manipulação; (3) entrega do produto final; (4) uso pelo consumidor. Dessa maneira, além do uso de um sistema conservante, boas práticas de fabricação auxiliam na prevenção contra contaminação microbiológica.
Segundo o FDA (U.S. Food and Drug Administration), por exemplo, produtos cosméticos não precisam ser estéreis, entretanto, eles não podem ser contaminados por microorganismos patogênicos e a densidade de organismos não patogênicos deve ser baixa. De acordo com o Personal Care Products Council, produtos para a área dos olhos e para bebês não podem conter acima de 500 unidades formadoras de colônia (UFC)/g; para os demais produtos os valores não podem ultrapassar 1000 UFC/g.
Na União Europeia, os cosméticos são divididos em duas categorias:
- Categoria 1: produtos para crianças abaixo de três anos, usados na área dos olhos e membranas mucosas;
- Categoria 2: demais produtos.
Para os produtos da categoria 1, a contagem de microrganismos aeróbios mesofílicos não deve ultrapassar 10² UFC/g ou 10² UFC/mL do produto. Já para os produtos da categoria 2, a contagem total de microrganismos aeróbios mesofílicos não deve ultrapassar 10³ UFC/g ou 10³ UFC/g. Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus e Candida albicans são considerados os principais potenciais patógenos em produtos cosméticos, portanto, não devem ser detectados em 1 g ou 1 mL em produtos da categoria 1 e em 0.1 g ou 0.1 mL em produtos da categoria 2.
De acordo com a ISO 17516/2014 os cosméticos não precisam ser estéreis, mas não devem conter quantidades excessivas de determinados microorganismos que afetam a qualidade do produto e segurança do consumidor.
Já no Brasil, segundo a RDC nº 481, de 23 de setembro de 1999, que contempla os parâmetros de controle microbiológico, os testes devem ser realizados de acordo com a faixa etária e local de aplicação do produto, obedecendo os limites de aceitabilidade definidos para cada caso. Na tabela abaixo é possível verificar os limites aceitos pela RDC 481/1999:
TIPOS | ÁREA DE APLICAÇÃO E FAIXA ETÁRIA | LIMITES DE ACEITABILIDADE |
---|---|---|
TIPO I | Produtos para uso infantil Produtos para área dos olhos Produtos que entram em contato com mucosas | a) Contagem de microrganismos mesófilos totais aeróbios, não mais que 10² UFC/g ou ml Limite máximo: 5 x 10² UFC/g ou ml b) Ausência de Pseudomonas aeruginosa em 1g ou 1ml; c) Ausência de Staphylococcus aureus em 1g ou 1ml; d) Ausência de Coliformes totais e fecais em 1g ou 1ml; e) Ausência de Clostrídios sulfito redutores em 1g (exclusivamente para talcos). |
TIPO II | Demais produtos cosméticos suscetíveis à contaminação microbiológica | f) Contagem de microrganismos mesófilos totais aeróbios, não mais que 10³ UFC/g ou ml; Limite máximo: 5 x 10² UFC/g ou ml g) Ausência de Pseudomonas aeruginosa em 1g ou 1ml h) Ausência de Staphylococcus aureus em 1g ou 1ml; i) Ausência de Coliformes totais e fecais em 1g ou 1ml; j) Ausência de Clostrídios sulfito redutores em 1g (exclusivamente para talcos). |
Estratégias de prevenção primária
As boas práticas de fabricação devem ser obedecidas de maneira rigorosa. A preparação de cosméticos deve ser realizada em condições assépticas para evitar a contaminação. Isso inclui tratamento da água, controle de matérias-primas, desinfecção de equipamentos e qualificação das pessoas envolvidas no processo.
Estratégias de prevenção física secundária
Esse tipo de proteção é feita com o uso de uma embalagem primária que cria uma barreira contra a contaminação. O formato e características da embalagem são fatores que podem influenciar na contaminação microbiológica. As características não incluem apenas as configurações físicas da embalagem (como potes, frascos, sachês e tubos), mas também a natureza e composição dos materiais (polímeros, vidros, etc). Embalagens no formato de pote, por exemplo, são mais propensas à contaminação do que sistemas fechados (airless), que são menos acessíveis à contaminação. Embalagens em tubo com bombeamento e que contêm aberturas estreitas também possuem boas estruturas para evitar a contaminação durante o uso. Além disso, é importante avaliar a compatibilidade da embalagem com a formulação, já que fenômenos como migração e adsorção podem influenciar na eficácia dos conservantes.
Conservantes
Conservantes são substâncias usadas para inibir o desenvolvimento de microrganismos em produtos cosméticos. Normalmente, o conservante é escolhido de acordo com três fatores:
- Boa eficácia antimicrobiana;
- Não toxicidade;
- Compatibilidade com os demais ingredientes da formulação.
Atualmente a maioria dos cosméticos possui um “sistema conservante”. Isso significa que diferentes substâncias com atividade antimicrobiana foram combinadas, aumentando o espectro de atividade, reduzindo a resistência contra microorganismos e o risco de toxicidade. Existem diversos sistemas conservantes disponíveis no mercado, e a partir do INCI Name é possível notar a combinação de duas ou mais substâncias para obtenção de um conservante de amplo espectro de proteção.
Ao escolher um conservante, é importante verificar no material técnico do ingrediente, contra quais microorganismos ele é eficaz, assim como o pH de eficácia que possui, concentração de uso e incompatibilidades.
Os conservantes mais usados em cosméticos
Classe | Exemplos |
---|---|
Ácidos orgânicos | Ácido sórbico, ácido benzoico, ácido salicílico, ácido dehidroacético |
Álcoois e Fenóis | Fenoxietanol, Cloroxilenol, Álcool benzílico, Ácido 4-hidroxibenzóico, Clorobutanol |
Aldeídos e Liberadores de formaldeídos | Imidazolidinil Uréia, DMDM Hidantoína, Quaternium-15, Diazolidinil Uréia |
Isotiazolinonas | Methylisothiazolinone, Metilcloroisotiazolinona |
Tabela com os principais conservantes usados nos cosmético
Adaptado de: HALLA, Noureddine et al.
É necessário que os conservantes usados estejam em conformidade com a Resolução 162/01 e suas atualizações (ou seja, a RDC 29/2012). Essa resolução lista os conservantes permitidos, assim como a concentração máxima autorizada. Além disso, no Brasil, os cosméticos são regularizados pela ANVISA, portanto, se mantenha sempre atualizado por meio de seus canais e documentos oficiais.
Ingredientes multifuncionais
Além do sistema conservante, existem outros ingredientes que podem auxiliar na proteção contra microorganismos. Os quelantes, por exemplo, como o EDTA Dissódico, bloqueiam o ferro, que é um componente necessário para o metabolismo e crescimento microbiano. Alguns ingredientes de origem natural, como extratos e óleos essenciais, possuem propriedades conservantes, de acordo com diversos estudos. Entretanto, o uso não é muito adequado, por conta de fatores como perda de atividade em diluições, dependência de pH, volatilidade e odor forte. Contudo, em um mercado cada vez mais vegetalizado, descobertas assim mostram possibilidades de inovação no futuro.
Challenge Test
O Challenge Test (Teste de Desafio do Sistema Conservante) é feito para avaliar a eficácia e estabilidade do sistema conservante em um determinado período de tempo. O teste consiste em inocular no produto determinada quantidade de microrganismos específicos (bactérias, leveduras e bolores). O produto deve estar protegido desde sua fabricação até o uso pelo consumidor e prazo final de validade.
O adequado é que o teste seja realizado em duas fases: a primeira, após a definição da fórmula do produto; e a segunda, após o término do teste de estabilidade e/ou compatibilidade da formulação com a embalagem.
Os métodos de análise estão descritos em materiais como Farmacopéias e CTFA Cosmetic Guidelines.
Apesar dos conservantes serem importantes, é difícil prever se eles serão eficazes, já que a eficácia depende de diversos fatores, como concentração, pH, temperatura, interação dos ingredientes e interação da formulação com a embalagem. Por isso o Challenge Test se faz necessário, para avaliar se o produto será conservado até sua data de validade.
Microrganismos mais utilizados
A padronização dos microrganismos usados permite abrangência morfológica e metabólica de bactérias, leveduras e fungos que estão amplamente distribuídos na natureza. Permite também a comparação de sistemas conservantes em diferentes tipos de produtos.
Os microrganismos mais utilizados nos testes são:
- Bactérias gram-positivas: Staphylococcus aureus
- Bactérias gram-negativas: Escherichia coli e Pseudomonas aeruginosa
- Bolores: Aspergillus niger
Leveduras: Candida albicans
Recomendações de laboratórios que realizam o Challenge Test
O Challenge Test deve ser realizado por laboratórios qualificados para tal. Abaixo estão algumas opções de laboratórios que oferecem testes microbiológicos para cosméticos:
1.Prolab Biotecnologia
- (11) 3685-4003
- (31) 3244-0189
- Website: https://prolabnet.com.br
2.Dosage
- (19) 3789-8610
- [email protected]
- Website: https://grupoinvestiga.com
3.Kosmoscience
- (19) 3829-3482
- (19) 3829-0841
- [email protected]
- Website:https://www.kosmoscience.com
4.Aktron
- (21) 3867-5800
- (21) 3867-5530
- [email protected]
- Website:https://baktron.com.br/
Conclusão
Cosméticos são sistemas complexos que precisam de proteção contra contaminação e desenvolvimento de microorganismos, favorecendo assim a estabilidade de produtos e garantindo segurança para os consumidores. Sistemas conservantes são substâncias usadas para proteger os sistemas cosméticos e, para avaliar a eficácia desses sistemas conservantes, é necessário a realização de testes. O Challenge Test consiste em inocular o produto com microorganismos específicos, verificando se o sistema conservante irá proteger a formulação até o prazo de validade final. A realização desses testes é feita por laboratórios microbiológicos qualificados.
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Referências
ANVISA, A. N. Guia de estabilidade de produtos cosméticos. Séries Temáticas, 2004.
HALLA, Noureddine et al. Cosmetics preservation: a review on present strategies. Molecules, v. 23, n. 7, p. 1571, 2018.
RUSSELL, A. D. Challenge testing: principles and practice. International journal of cosmetic science, v. 25, n. 3, p. 147-153, 2003.
SCHMITT, PRISCILA DE OLIVEIRA. INFLUÊNCIA DE EXCIPIENTES FARMACÊUTICOS SOBRE A EFICÁCIA DE SISTEMAS CONSERVANTES.
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