desenvolvimento cosmético

Os efeitos dos alfa hidroxiácidos na pele humana

Cleber Barros
Escrito por Cleber Barros em 31 de janeiro de 2019
10 min de leitura
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Entenda o papel dos alfa hidroxiácidos em formulações cosméticas e peelings químicos

Os alfa hidroxiácidos são ácidos orgânicos naturais que podem ser encontrados naturalmente em diversos vegetais, como cana-de-açúcar (ácido glicólico) e frutas (ácidos cítrico e málico), e também no leite azedo (no caso do ácido lático). Estruturalmente, os AHAs são ácidos orgânicos fracos, com um ou mais grupos hidroxila atrelados ao carbono alfa.

Um estudo realizado na década de 70 indicou que os AHAs poderiam ter efeitos potentes para amenizar desordens cutâneas relacionadas à queratinização, pois têm a capacidade de diminuir a coesão dos corneócitos que se encontram imediatamente acima da camada granulosa, separando e descamando o estrato córneo. Portanto, os peelings de AHAs são usualmente aplicados superficialmente ou com profundidade média, como aqueles utilizados para tratar a acne, cicatrizes, melasmas, hiperpigmentações, vermelhidão, sinais de envelhecimento e seborreia.

Os AHAs podem melhorar a aparência da pele enrugada por meio da síntese de glicosaminoglicanos e aumentando o espessamento da pele. Devido aos muitos benefícios que oferecem, os AHAs são amplamente utilizados em tratamentos de pele, sendo que podem ser aplicados em qualquer tipo de pele e não oferecem riscos sérios.  

Estudos demonstraram que os AHAs podem prevenir o desenvolvimento de cânceres de pele induzidos por raios UV, e muitos dermatologistas sugeriram que esses ácidos também podem ter outros benefícios na pele, como atividade antioxidante.

Contudo, outros pesquisadores têm visões diferentes e se opõem a esse tipo de tratamento, uma vez que alguns estudos indicaram que a aplicação tópica dos alfa hidroxiácidos pode aumentar a fotossensibilidade da pele aos raios UVB quando a pele é submetida a exposição solar, e que os AHAs podem induzir pigmentação cutânea atípica.

O questionamento se os alfa hidroxiácidos são um aliado ou um inimigo da pele permanece, e a influência desses ácidos tanto na fototoxicidade quanto na fotoproteção é incerta.

Dados não clínicos divulgados pela FDA (Food and Drug Administration, órgão dos EUA que se assemelha à ANVISA, no Brasil) não levantaram alertas de segurança relevantes em relação ao uso do ácido glicólico usado topicamente em concentrações baixas, mas qualquer forma, é necessário tomar cuidado com os efeitos adversos que os alfa hidroxiácidos podem causar. Esses efeitos podem incluir vermelhidão, inchaço, queimação e prurido.

 

 

A eficácia dos AHAs

De acordo com muitos estudos, a eficiência dos alfa hidroxiácidos depende do seu pH, da sua concentração e do tempo de exposição ao qual são submetidos.

Por exemplo, os AHAs, quando utilizados em shampoos e condicionadores, são rapidamente removidos da pele por meio do enxágue, resultando em uma aplicação que é extensa e rápida.

Em peelings químicos, os AHAs são utilizados em intervalos de exposição entre 2 e 4 minutos, em intervalos variáveis, que podem ser superiores a seis meses.

Os AHAs possuem diferentes papéis em relação às células da pele. Um estudo demonstrou que o ácido cítrico induz a proliferação de colágeno do tipo I e pró-colágeno tipo II, e que o ácido glicólico tem capacidade de melhorar a epiderme e a derme, o que demonstra a utilidade dos alfa hidroxiácidos no rejuvenescimento da pele fotodanificada. Além disso, o ácido cítrico, quando utilizado a 20%, pode melhorar a espessura da epiderme e a quantidade de glicosaminoglicanos na pele danificada pelo sol, além de ser capaz de melhorar a taxa de renovação da pele e tratar os possíveis danos induzidos pela radiação solar.

Um estudo determinou que a aplicação tópica de ácido glicólico a 10% por 12 semanas aumentou a sensibilidade da pele à radiação UV e aumentou a formação de células com queimaduras solares. Um estudo anterior demonstrou que um co-tratamento de AHAs com uma alta concentração de ácido glicólico (5mM) e radiação UVB resultou em um efeito sinérgico na apoptose dos queratinócitos humanos. Os resultados desses estudos, portanto, sugeriram que o uso dos AHAs na pele requer atenção.

 

A segurança dos AHAs

Ácido cítrico, ácido málico e ácido lático são membros cruciais do ciclo de Krebs e dos processos de fermentação das células. Os ácidos málico e cítrico estão abundantemente presentes em muitas frutas e sementes, como vagens de cacau, uvas e amoras silvestres. Apesar de muitos estudos terem investigado compostos de extratos de frutas, poucos investigaram as funções biológicas dos ácidos málico e cítrico puros.

Desde 1997, a FDA classificou formulações cosméticas contendo os ácidos málico e cítrico são “geralmente reconhecidas como seguras”. Desde então, esses ácidos são utilizados como ajustadores de pH e umectantes em formulações cosméticas.

Alguns testes clínicos demonstraram que o ácido málico pode ser irritante, devido às características da sua interação com a epiderme, mas também foi demonstrado que conforme o pH do produto aumenta, menos irritação é observada.

 

 

Apoptose induzida por alfa hidroxiácidos

A apoptose (também chamada de morte celular programada) pode ser ativada por dois mecanismos principais: a via dependente de mitocôndrias (via intrínseca) e a via dependente do receptor do sinal de apoptose (via extrínseca). O receptor do Fas, o Fas ligante e a caspase-8 são partes de uma via celular importante que regula a indução de apoptose em diversos tipos de células e tecidos. A falha dos mecanismos de apoptose faz com que as células se tornem envelhecidas e percam sua funcionalidade, promovendo assim uma maior chance de promoção de cânceres.

O ácido cítrico possui a capacidade de ativar as caspases 9 e 3, que possuem papel importante na indução da apoptose pela via dependente de caspases. Além disso, esse ácido pode induzir a apoptose por causar aumento na expressão da caspase 8, dos receptores de apoptose e estimulação da via intrínseca de apoptose nos queratinócitos. Todos esses fatores podem causar aumento na renovação celular, ou seja, na renovação da pele.

O ácido málico possui propriedades antiproliferativas nas células da pele, por inibição da progressão do ciclo celular. Além disso, esse ácido induz proteínas associadas ao estresse, que ativam tanto a via intrínseca quanto a via extrínseca da apoptose.

Apesar de os ácidos málico e cítrico serem diferentes entre si, eles demonstraram ativar as mesmas vias apoptóticas nas células cutâneas.

 

 

O ácido lático e a microbiota cutânea

O ácido lático (na forma de lactato de sódio) é bastante conhecido por ser uma das substâncias que compõem o fator de hidratação natural da pele, e, por isso, é bastante utilizado como um hidratante cutâneo. Foi demonstrado que esse ácido é capaz de ativar a renovação da pele por induzir a apoptose (tanto pela via intrínseca quanto pela via extrínseca) e inibir a proliferação excessiva dos queratinócitos.

O ácido lático tende a ser menos irritante que o ácido glicólico, o que pode ser explicado pela presença do ácido lático e de bactérias associadas ao ácido lático na microbiota (tanto da pele quanto do trato digestivo).

A utilização de compostos pré e probióticos têm sido cada vez mais relevante na dermatologia e na cosmetologia, uma vez que estudos demonstraram que essas bactérias possuem importantes funções no organismo humano, como defesa contra outros microrganismos potencialmente patogênicos, modulação (sistêmica e local) do sistema imune e até mesmo regulação de processos alérgicos.

Foi demonstrado que o ácido lático pode ser regulado por neuropeptídeos, como a substância P, que é abundante na pele e no trato gastrointestinal (TGI), e age como um transmissor bidirecional entre a pele e o TGI. A substância P contribui com diversas patologias da pele, como dermatites atópicas, psoríase e acne. A liberação do ácido lático regulado pela substância P ajuda na manutenção do status anti-inflamatório da pele, e pode ajudar na regulação do sistema imune intestinal.

 

 

Efeitos controversos dos AHAs

Muitos estudos foram feitos para investigar a capacidade que os ácidos possuem de reparar e retardar os sinais do envelhecimento na pele, e os resultados sugerem que esses efeitos podem ser causados pela capacidade que os AHAs possuem de estimular a renovação da pele, uma vez que o aparecimento de sinais do envelhecimento da pele é proporcional ao envelhecimento das células cutâneas. Portanto, a utilização de peelings químicos contendo AHAs é bastante recomendada, já que esse tipo de tratamento oferece bons resultados tanto a curto como a longo prazo.

Contudo, outras vias de estudo demonstraram que a aplicação desses ácidos na pele causa um efeito controverso, que é o aumento da sensibilidade da pele aos raios UV. Contando com o fato de que o envelhecimento cutâneo pode ser causado por micro-inflamações causadas pela radiação UV (fotoenvelhecimento), é muito importante que os pacientes tratados com AHAs tomem as precauções necessárias para reduzir a exposição da pele aos raios UV.

No contexto da epiderme, a natureza ácida dos AHAs gera a diminuição do pH cutâneo, inibe as transferases e quinases, e interfere na formação de ligações iônicas, fatores que contribuem para a resolução dos desmossomos e estimula a descamação. As complicações possíveis relacionadas aos peelings químicos são hiperpigmentação pós-inflamatória, infecções, cicatrizes, reações alérgicas, eritema persistente e alteração na textura da pele. Um estudo demonstrou que os AHAs em concentração de 1% são capazes de alterar o pH das três camadas externas do estrato córneo, enquanto que em concentração de 1% são capazes de afetar todas as camadas da pele.

Tanto os efeitos adversos como o aumento da sensibilidade aos raios UV causados pelos AHAs estão associados com a concentração e pH nos quais esses ácidos são aplicados na pele.

Um estudo buscou entender a relação da concentração dos AHAs com os efeitos que eles oferecem na pele. Para isso, os pesquisadores fizeram aplicações de ácido glicólico em baixas e em altas concentrações em modelos de pele. Os resultados desse estudo demonstraram que, em baixas concentrações, o ácido glicólico é capaz de oferecer efeitos benéficos, e até mesmo anti-inflamatórios, enquanto que em altas concentrações, esse ácido apresenta efeitos fototóxicos, causando irritação da pele e descamação, fatores que aumentam a fotossensibilidade da pele.

 

Conclusões

Quando aplicados na pele humana, diferentes concentrações de AHAs oferecem diferentes benefícios cosméticos e terapêuticos.

Se os AHAs são aliados ou inimigos da pele humana, depende da sua concentração de uso, sendo que os ácidos utilizados como agentes de peelings em altas concentrações tendem a destruir a coesão dos corneócitos da barreira da pele e resultam em irritação, que é prejudicial à pele, enquanto que, em baixas concentrações, podem ser benéficos à pele, devido às modificações epigenéticas que oferecem ao complexo inflamatório da pele. Em outras palavras, os AHAs podem possuir efeitos contrários na pele, dependendo da sua concentração.

 

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Referência:
Sheau-Chung Tang, Jen-Hung Yang. [Dual Effects of Alpha-Hydroxy Acids on the Skin] Molecules 2018, 23(4), 863; doi:10.3390/molecules23040863.

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One Reply to “Os efeitos dos alfa hidroxiácidos na pele humana”

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